I, 1 – Y. S. – Patañjali
século III a.C. …
Assim, em uma pequena frase, um pequeno verso, de forma breve, concisa e que, a princípio parece lacônica, mas que é muito profunda, começa a ser exposto o ensinamento, a Tradição do Yoga por seu codificador, do qual se sabe muito pouco e cuja figura lendária e mitológica também é objeto de estudo. Neste primeiro verso do Yoga Sutra o sábio Patañjali ao escrevê-lo, tão repetidamente recitado passa a mensagem que enuncia a relação Mestre-discípulo e cujo ensinamento os une em um relacionamento de mútua confiança em que o aluno voluntariamente assume o compromisso de aprender e o professor o de ensinar. O enunciado deste primeiro sutra também pressupõe que há uma Tradição a ser mantida por esta relação e de que o conhecimento deve ser transmitido por pessoas que alcançaram alguma realização e por isso estariam aptas e autorizadas a transmitir este ensinamento.
Atha – o aluno em um momento auspicioso encontrará ānuśāsanam – seu professor e estes estabelecerão um forte laço de aprendizagem e ensinamento, onde um assume o compromisso de aprender, estudar e praticar e o outro de ensinar, compartilhar e transmitir conhecimento. Aquele a quem atha chama de ānuśāsanam já obteve uma realização e por isso está apto, e de certa forma autorizado, a ensinar. Assim todo conhecimento acumulado por milhares de anos e pela dedicação de muitas pessoas pode continuar vivo através do relacionamento, do vínculo, do elo entre professor e aluno, porque o professor um dia também já foi aluno e continua sendo, mesmo enquanto ensina …
A mitologia conta que Patañjali nasceu do gesto em prece com as mãos unidas em frente ao coração feito por Gonika, uma mulher já em idade avançada, que não tivera filhos e que detinha um profundo conhecimento do Yoga e não teria a quem deixar seu legado de aprendizagem e sabedoria. Gonika com este gesto conhecido como anjali mudra pediu a Brahma que descansava sobre uma flor de lótus que nascera do umbigo do deus Vishnu, que por sua vez estava adormecido sobre o corpo de Ananta – a serpente que mantém o universo em equilíbrio.Vishnu só se manifesta quando o universo está em perigo, pois ele é o aspecto conservador de Deus e Brahma o aspecto criador. Brahma ouve o pedido de Gonika, mas Ananta também ouve, pois tem o desejo de aprender Yoga. Ananta pede a Brahma que lhe permita descer até à Terra para aprender o que Gonika tanto quer ensinar. Neste momento, Vishnu parece despertar com os movimentos inquietos de Ananta. Brahma então, concede a graça à Gonika e também à Ananta. No exato momento em que Gonika faz o gesto de união das mãos em frente ao coração surge diante dela um rapaz de 16 anos que é um pedaço de Ananta que caiu do céu por obra de Brahma. O aspecto do rapaz é meio homem meio serpente e se chama Patañjali. A palavra anjali em sânscrito é juntar, unir e pat significa cair, descer. Surge então a figura lendária e o mito de Patañjali que permeia todo o Yoga, a medicina ayurvedica e também a gramática sanscrita todas associadas à figura de Patãnjali como mestre destas áreas e que este veio dos céus para agraciar a Humanidade com sua arte e seu conhecimento.
Podemos ver o quanto as vidas destes personagens mitólogicos estão entrelaçados, pois Gonika queria passar adiante o conhecimento e a sabedoria acumulado ao longo de sua vida e Ananta queria aprender sobre Yoga.
É muito comum este tipo de histórias na mitologia indiana. Isso pressupõe o quanto as vidas humanas estão entrelaçadas entre si, com a natureza e com os aspectos da divindade.
Da figura lendária de Patañjali muito pouco se sabe. Ele é o autor dos Yoga Sutra, mas ele não criou o Yoga, apenas o codificou. E parece ter escrito ou transmitido oralmente também outros tratados que lhe são atribuídos como os de medicina e gramática. O Yoga Sutra é fruto de grandes debates e questionamentos entre os sábios antigos da Índia e ao que tudo indica Patañjali teria sido escolhido para fazer a redação ou a codificação do Yoga, porque devia ter um profundo conhecimento sobre o assunto. Na Índia antiga o conhecimento era transmitido pela Tradição Oral o que acontece até os dias de hoje e diz-se que quando um conhecimento está em perigo de se perder ele também pode ser escrito.